quinta-feira, 21 de março de 2019
Transubstancial (2003) - Torquato Joel
Uma visão existencialista da obra do poeta Augusto dos Anjos a partir de fragmentos de seus poemas.
Ficha Técnica:
Ano: 2003
Cidade: João Pessoa - PB
País: Brasil
Gênero: Ficção
Prêmios:
Melhor curta da crítica (Festival de Brasília)
Melhor curta, direção, Prêmio BNB
Melhor fotografia no Cine PE
Melhor fotografia no Festival de Belém (PA)
Melhor curta no CURTA-SE
Melhor trilha sonora musical no Vitória Cine Vídeo
Direção e Roteiro: Torquato Joel
Produção Executiva: Moema Müller
Fotografia e Câmara: Mauro Pinheiro JR, ABC
Direção de Arte: José Rufino
Montagem/Edição: Flávio Zettel
Trilha Musical e Direção Musical: Eli-Eri Moura (COMPOMUS-UFPB)
O Poeta - Walmar Pessoa
O Pai - Fernando Teixeira
Voz do Poeta - Luís Carlos Vasconcelos
Voz do Destino - Carlos Gregório
Som Direto: Sílvio Da-Rin
Edição de Som: Edwaldo Mayrink, Guillermo Tinoco
Mizagem: Ulysses Lopes, Zé Ronaldo Leal
Consultoria de Mizagem: Roberto Leite
Consultoria de Roteiro: Ângela Bezerra de Castro, Chico Viana
Direção de Produção: Heleno Bernardo
Figurino e Produção de Arte: Romero Souza
Produção de Elenco: Nanêgo Lira
Primeiro Assistente de Câmara: Lula Carvalho
Segundo Assistente de Câmara: João Carlos Beltrão
Eletricista: João Sagatio
Maquinista: Roberto Machado
Produção de Set: Carlos Casteli
Maquiagem: Williams Muniz
Trucagem: Ronald Palatnik
Produção de Finalização: Karen Barros
Efeitos Sonoros: Didier Guigue (COMPOMUS-UFPB)
Ruídos de Sala: Jorge Pimenta
Montagem de Negativo: Ângela Bífaro
Primeira Assistente de Direção: Ana Isaura Nogueira
Segundu Assistente de Direção: Ferdinando Dantas
Assistente de Arte: Maria Botelho
Microfonista e Assistente de Som: Joerbson Santana
Gravação das Locuções: Alexandre Jardim
ELENCO
Agricultor - José Guabiraba Carvalho
Índio - Antônio Aureliano
Negro - Gerson Severino da Silva
Sombras do Poeta - Márcio Rodrigues, Joacy Alves
Declamantes (por ordem de apresentação):
Linaldo Guedes, Jocerlan e Silva, Celsa Monteiro
Jacinto Moreno, Aparecida Melo, Williams Muniz
Participação Especial: Zezita Matoos, Neide Melo
Elenco de Apoio:
Alêssa Nasiasene, Ana Luisa Camino, Augusto Magalhães,
Cida Costa, Clezite Alves de Souza, Eulina Barbosa,
Horieby, João Dantas, Maria Botelho, Maria Clara,
Marcus Vinícius, Thiago Henrique, Vima Casé
Voz do Juiz: Iveraldo Lucena
Vozes de Rezas:
Maria Oneide Monteiro, Marlene Barbosa, Regina Ribeiro,
Romildo Duarte Menezes, Vilma Soares
Video Assist: André Morais
Boy de Set: Gilvan Dantas
Equipe de Apoio de Arte:
Adriano Fidelis, Marconi Nicácio, Joab Ribeiro, "Dedé" Alves
Alimentação - Espaço das Refeições
Câmara - JKL Cine
Luz e Maquinária - Quanta
Trucas e Créditos - Movedoll Cinematográfica
Estúdio de Mixagem - VTI
Laboratório - LABOCINE
Música Incidental:
"Ô Serená Serená", na voz de Odete de Pilar (gravada pelo LEO/UFPB)
Trilha Sonora Original Gravada por membros do Quinteto Paraíba:
Yerko Tabila (primeiro violino), Ronedilk Cavalcanti (segundo violino),
Samuel Spinoza (viola), Nelson Campos (violoncelo)
Instrumentos MIDI: Eli-Eri Moura
Gravação, Mixagem e Edição da Trilha Sonora Musical:
SG Studio Digital (João Pessoa - PB)
Técnico de Gravação: Igor Ayres
Mixagem e Edição da Trilha Sonora: Sérgio Gallo
A Árvore da Serra - AUGUSTO DOS ANJOS (1884-1914)
— As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!
— Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pos almas nos cedros... no junquilho...
Esta árvore, meu pai, possui minh'alma! ...
— Disse — e ajoelhou-se, numa rogativa:
'Não mate a árvore, pai, para que eu viva!'
E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!"
Vandalismo - AUGUSTO DOS ANJOS (1884-1914)
Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Canta a aleluia virginal das crenças.
E as ametistas e os florões e as pratas.
Vertem lustrais irradiações intensas
Cintilações de lâmpadas suspensas
E nesses templos claros e risonhos...
Como os velhos Templários medievais
Entrei um dia nessas catedrais
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!"
E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Uma análise do poema:
O poema é em si uma metáfora, onde o coração é o "querer" do poeta, como o amor espiritual, virtuoso e puro expresso na primeira estrofe. A segunda estrofe reitera e detalha estas virtudes onde o "querer" é minuciosamente enunciado com a descrição de um templo grandioso, local de louvor e adoração. O primeiro terceto representa a paixão como um templário, uma autoridade dominadora que arrebata e toma a virtude. Os gládios e hastas simbolizam os ímpetos do desejo sobre o amor espiritual idealizado e na "chave de ouro", prevalece o desejo que submete a paixão.
Vandalismo trata das rupturas internas, dos valores que uma vez idealizados; confrontam no íntimo e o arrebatamento, a paixão, nos leva a uma ruptura para sustentar uma nova ordem. O conflito entre o amor idealizado e o arrebatamento é a figura do templário e seu poder confessional. É uma representação profunda para o período que viveu o poeta, num ambiente de amenidades e manifestações idealizadas.
Versos a um Coveiro - AUGUSTO DOS ANJOS
Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos (Cruz do Espírito Santo, 20 de abril de 1884 — Leopoldina, 12 de novembro de 1914) foi um
poeta brasileiro, identificado muitas vezes como simbolista ou parnasiano. Todavia, muitos críticos, como o poeta Ferreira Gullar, preferem identificá-lo como pré-modernista, pois encontramos características nitidamente expressionistas em seus poemas.
É conhecido como um dos poetas mais críticos do seu tempo, e até hoje sua obra é admirada tanto por leigos como por críticos literários. Sua poesia chocou a muitos, principalmente aos poetas
parnasianos, mas hoje é um dos poetas brasileiros que mais foram reeditados. Sua popularidade se deveu principalmente ao sucesso entre as camadas populares brasileiras e à divulgação feita pelos modernistas. Hoje diversas editoras brasileiras publicam edições de Eu e Outras Poesias.
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Numerar sepulturas e carneiros, Reduzir carnes podres a algarismos, Tal é, sem complicados silogismos, A aritmética hedionda dos coveiros! Um, dois, três, quatro, cinco... esoterismos Da Morte! E eu vejo, em fúlgidos letreiros, Na progressão dos números inteiros A gênese de todos os abismos! Oh! Pitágoras da última aritmética, Continua a contar na paz ascética Dos tábidos carneiros sepulcrais Tíbias, cérebros, crânios, rádios e úmeros, Porque, infinita como os próprios números A tua conta não acaba mais!"
Poema Negro - AUGUSTO DOS ANJOS ( narração Othon Bastos )
Para iludir minha desgraça, estudo.
Intimamente sei que não me iludo.
Para onde vou (o mundo inteiro o nota)
Nos meus olhares fúnebres, carrego
A indiferença estúpida de um cego
E o ar indolente de um chinês idiota!
A passagem dos séculos me assombra.
Para onde irá correndo minha sombra
Nesse cavalo de eletricidade?!
Caminho, e a mim pergunto, na vertigem:
— Quem sou? Para onde vou? Qual minha origem?
E parece-me um sonho a realidade.
Em vão com o grito do meu peito impreco!
Dos brados meus ouvindo apenas o eco,
Eu torço os braços numa angústia doida
E muita vez, à meia-noite, rio
Sinistramente, vendo o verme frio
Que há de comer a minha carne toda!
É a morte — esta carnívora assanhada —
Serpente má de língua envenenada
Que tudo que acha no caminho, come...
— Faminta e atra mulher que, a 1 de janeiro,
Sai para assassinar o mundo inteiro,
E o mundo inteiro não lhe mata a fome!
Nesta sombria análise das cousas,
Corro. Arranco os cadáveres das lousas
E as suas partes podres examino...
Mas de repente, ouvindo um grande estrondo,
Na podridão daquele embrulho hediondo
Reconheço assombrado o meu destino!
Surpreendo-me, sozinho, numa cova.
Então meu desvario se renova...
Como que, abrindo todos os jazigos,
A morte, em trajos pretos e amarelos,
Levanta contra mim grandes cutelos
E as baionetas dos dragões antigos!
E quando vi que aquilo vinha vindo
Eu fui caindo como um sol caindo
De declínio em declínio; e de declínio
Em declínio, com a gula de uma fera,
Quis ver o que era, e quando vi o que era,
Vi que era pó, vi que era esterquilínio!
Chegou a tua vez, oh! Natureza!
Eu desafio agora essa grandeza,
Perante a qual meus olhos se extasiam...
Eu desafio, desta cova escura,
No histerismo danado da tortura
Todos os monstros que os teus peitos criam.
Tu não és minha mãe, velha nefasta!
Com o teu chicote frio de madrasta
Tu me açoitaste vinte e duas vezes...
Por tua causa apodreci nas cruzes,
Em que pregas os filhos que produzes
Durante os desgraçados nove meses!
Semeadora terrível de defuntos,
Contra a agressão dos teus contrastes juntos
A besta, que em mim dorme, acorda em berros
Acorda, e após gritar a última injúria,
Chocalha os dentes com medonha fúria
Como se fosse o atrito de dois ferros!
Pois bem! Chegou minha hora de vingança.
Tu mataste o meu tempo de criança
E de segunda-feira até domingo,
Amarrado no horror de tua rede,
Deste-me fogo quando eu tinha sede...
Deixa-te estar, canalha, que eu me vingo!
Súbito outra visão negra me espanta!
Estou em Roma. É Sexta-feira Santa.
A treva invade o obscuro orbe terrestre.
No Vaticano, em grupos prosternados,
Com as longas fardas rubras, os soldados
Guardam o corpo do divino mestre.
Como as estalactites da caverna,
Cai no silêncio da cidade eterna
A água da chuva em largos fios grossos...
De Jesus Cristo resta unicamente
Um esqueleto; e a gente, vendo-o, a gente
Sente vontade de abraçar-lhe os ossos!
Não há ninguém na estrada da Ripetta.
Dentro da Igreja de São Pedro, quieta,
As luzes funerais arquejam fracas...
O vento entoa cânticos de morte.
Roma estremece! Além, num rumor forte,
Recomeça o barulho das matracas.
A desagregação da minha ideia
Aumenta. Como as chagas da morféa
O medo, o desalento e o desconforto
Paralisam-se os círculos motores.
Na eternidade, os ventos gemedores
Estão dizendo que Jesus é morto!
Não! Jesus não morreu! Vive na serra
Da Borborema, no ar de minha terra,
Na molécula e no átomo... resume
A espiritualidade da matéria
E ele é que embala o corpo da miséria
E faz da cloaca uma urna de perfume.
Na agonia de tantos pesadelos
Uma dor bruta puxa-me os cabelos,
Desperto. É tão vazia a minha vida!
No pensamento desconexo e falho
Trago as cartas confusas de um baralho
E um pedaço de cera derretida!
Dorme a casa. O céu dorme. A árvore dorme.
Eu, somente eu, com a minha dor enorme
Os olhos ensangüento na vigília!
E observo, enquanto o horror me corta a fala,
O aspecto sepulcral da austera sala
E a impassibilidade da mobília.
Meu coração, como um cristal, se quebre
O termômetro negue minha febre,
Torne-se gelo o sangue que me abrasa,
E eu me converta na cegonha triste
Que das ruínas duma casa assiste
Ao desmoronamento de outra casa!
Ao terminar este sentido poema
Onde vazei a minha dor suprema
Tenho os olhos em lágrimas imersos...
Rola-me na cabeça o cérebro oco.
Por ventura, meu Deus, estarei louco?!
Daqui por diante não farei mais versos."
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